Vem-se atribuindo aos jogos populares um sentido comum à Malha, ao Chinquilho, à Cabra-Cega, às Escondidas e outros assim. E pensa-se geralmente em actividades através das quais se busca prazer, com regras muito simples e meios rudimentares. Actividades, claro está, que para uns proporcionam a vitória e para outros a derrota, mas que não têm a regulamentação, o rigor, o espírito competitivo e a expansão do desporto, em relação ao qual se consideram, por isso, subalternas e de somenos importância. Os leitores, que conceberem o jogo popular segundo esta óptica, irão estranhar (…) modalidades lúdicas, inseridas nos capítulos regionais, como Justo Juiz, Magusto, Cantar os Reis, Maio-Moço, etc. Pede-se-lhes que reflictam, consultando, se possível, o livro do autor Teoria do jogo. O jogo popular, se tem algumas das características apontadas, tem outras mais. E não pode entender-se de um modo simplista e com o tolerante sorriso de brindar as coisas algo interessantes mas de pouca monta. Digamos, claramente, que ele é uma manifestação cultural das mais significativas, situando-se destacadamente, para utilizar palavras de Castoriadis sobre a cultura, em “tudo o que está para além do estritamente instrumental ou funcional”. Digamos, ainda, que não se circunscreve às actividades físicas, mas abrange todas aquelas actividades, de carácter mais ou menos mimético, em que ao prazer específico de ser bem sucedido se associa uma dificuldade a vencer. O jogo é um todo, mais complexo do que à primeira vista parece, e pelo menos os elementos psicológicos e antropológicos, aos quais também não deve ser reduzido, precisam de estar sempre no pensamento dos técnicos e estudiosos. E, numa escola, seja ela de que nível for, só a interdisciplinaridade, pela dedicação humilde dos professores, proporciona um estudo proveitoso aos alunos. Mais tarde ou mais cedo, o jogo, que anima profundamente a vida, instituir-se-á como tema necessário do ensino-aprendizagem.
in CABRAL, António – Jogos populares portugueses de jovens e adultos. 3.ª ed. Lisboa : Notícias, 1998. ISBN 972-46-0924-3.